terça-feira, 28 de outubro de 2008

blindness


A cegueira incomoda. O “ensaio” sobre ela perturba. Mais ainda em formato de filme com o sincretismo típico da telona. Assistir à adaptação de Fernando Meirelles para o cinema do Nobel “O ensaio sobre a cegueira” (José Saramago) não é fácil. Aliás, é preciso vontade e coragem. Mesmo para aqueles que só “vêem” com os ouvidos, a perturbação é intensa através de efeitos sonoros apurados e oportunos. Para os que vêem, os planos de imagem são “desmesurados” e acabam por mostrar detalhes pouco agradáveis de uma trama fictícia, surreal. Ninguém se olha no olho, nem o personagem, o espectador. O elenco de atores de diversas origens e raças - inclusive com a brasileira Alice Braga - traz a mescla suscetível a cegueira branca. Ou seja, qualquer um e todos nós. Para se comunicar, lógico, usam o inglês. Mesmo assim, há diálogos em japonês. Fora isso, em dois momentos participa a língua portuguesa (finalmente!). Hora um locutor de rádio a falar em português de Portugal, hora, (também através das ondas do rádio), uma música brasileira de raiz. E só. Meirelles traduz com o cinema o que Saramago escreve com suas palavras precisas. Se o português diz ter preferido o filme ao livro, afirmo ter preferido o livro. Mas essa é uma outra questão. Um tanto passional, talvez. O que importa mesmo é que o enredo não passa de uma grande figura de linguagem que chama a atenção para o quanto a sociedade acaba por ser cega. Carecemos de olhos para realmente enxergar. Viva a obra universal de Saramago, viva o cinema “brasileiro” de Meirelles.